sexta-feira, 30 de outubro de 2015


Misteriosos assasinatos
A casa parecia sufocada pelas árvores enormes que encobriam o telhado, pelo mato alto que não deixava passagem e pelo cheiro forte e fétido que exalava. Os gatos, entretanto, não se importavam entrando e saído, subindo e descendo, miando e ronronando, se espreguiçando e bocejando como se vivessem em um palacete.
O certo é que não eram os únicos moradores daquela casa. Os outros habitantes raramente eram vistos e quando apareciam estavam mortos, só os cadáveres espalhados pela sala, pelos quartos, pelo jardim.
A dona da casa, uma jovem solitária, mas não tão solitária assim. Muitos animais viviam por ali. Contudo os gatos eram sua companhia preferida. Saia todas as manhãs bem cedo, não se sabe para onde. Voltava ao entardecer e passava até altas horas acariciando os felinos e contando e recolhendo os cadáveres. A mais nada se dedicava. De tal modo que a casa permanecia muito suja, camadas e camadas de pó sobre o chão, acumuladas sobre os móveis, cutão embolado nos cantos. Traças penduradas em seus casulos pelo teto. Aranhas desciam e subiam pelas paredes com suas teias espalhadas pelos armários, embaixo dos móveis. Lagartixas tranquilas saiam de trás dos quadros e das cortinas empoeiradas. Longas trilhas de formigas trabalhavam livres pela cozinha, subiam na pia repleta de louça suja, no fogão grudento, ao redor da geladeira e por vezes atacavam a ração dos felinos. Mosquitinhos se refestelavam com as bananas apodrecidas em uma espécie de fruteira.
A jovem depois de, cuidadosamente, um a um, acariciar o pelo de seus animais preferidos recolhia e contava os cadáveres: -  Hoje foram três. Se todos os dias os menos três forem mortos, por semana serão vinte e um, por mês noventa, e por ano dois mil oitocentos e noventa e cinco a menos no planeta.
Ela tinha ódio desses seres. Sentia um regozijo com a morte deles. Cavou um buraco enorme no fundo do quintal onde os enterrava diariamente.
 Uma certa noite ela não dormiu tamanha a euforia que ficou com a quantidade enorme de cadáveres recolhidos.
Como morriam? Ah! Preciso dizer! E os assassinos? Eram seus gatos. Depois de desferirem várias patadas deixavam os ali no local do crime, como um troféu e um presente de gratidão.
A jovem encontrava os presentes de seus felinos depois de uma espécie de caça ao tesouro.  Um tesouro dentro de uma gaveta esquecida aberta, outro embaixo da geladeira, outro atrás das plantas...
Estes seres não se deixavam morrer assim tão fácil. Possuem táticas, se fingem de mortos, ficam paralisados esperando que o inimigo se afaste. Os gatos, esperteza ancestral, atentos, ao mínimo movimento atacam novamente até que uma gosma branca confirme o óbito.

Maricy Montenegro 

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